Na cozinha da minha avó, lavar o arroz era quase um ritual. Três lavagens, movimentos circulares com as mãos e uma água esbranquiçada que, segundo ela, “carregava o peso do mundo embora”. Só anos depois fui entender que aquilo fazia mais sentido do que parecia — mas também podia estar tirando mais do que devia.
Lavar o arroz é um gesto automático para muita gente. Mas será que estamos fazendo isso da forma correta? Ou pior: será que estamos perdendo nutrientes e sabor por causa de um costume mal explicado?
Por que a gente lava o arroz, afinal?
O principal motivo para lavar o arroz é remover o excesso de amido solto nos grãos. Esse amido é o responsável por deixar o arroz mais empapado quando cozido — o famoso arroz “grudento” que muitos evitam.
Além disso, há a questão da limpeza. O arroz pode vir com resíduos de pó, cascas soltas ou até traços de impurezas do armazenamento. Lavar ajuda a garantir um preparo mais higiênico.
Só que aqui começa o problema: lavar demais ou de forma errada também leva embora parte dos micronutrientes naturais do grão.
Quando lavar é demais?
O arroz branco, por exemplo, já ou por um processo de refinamento que remove a maior parte da casca, do farelo e do germe. Com isso, muitos nutrientes (como fibras, vitaminas do complexo B e minerais) já se foram. Quando você lava demais, especialmente esfregando com força e descartando a água várias vezes, o que resta também vai embora.
É como enxaguar um pano limpo: a cada nova água, sai algo que já podia ficar.
Já o arroz integral ainda mantém suas camadas externas e, por isso, conserva muito mais nutrientes. Nesse caso, lavar vigorosamente pode tirar até substâncias antioxidantes da casca.
Ou seja, sim: muita gente está lavando o arroz do jeito errado — e jogando fora aquilo que paga para ter.
A diferença entre lavar e enxaguar
Uma coisa que aprendi com uma nutricionista que me ajudou a montar um plano alimentar: enxaguar é diferente de lavar com força. No primeiro caso, você a água para retirar o excesso de sujeira e algum pó superficial. No segundo, há um atrito intencional para remover o amido — o que só deve ser feito em determinadas situações.
Se você gosta de um arroz mais solto, como o agulhinha, pode lavar uma ou duas vezes no máximo, com movimentos suaves. Mas se estiver fazendo um prato que pede arroz cremoso, como um risoto, não lave o arroz! O amido é essencial para dar liga e textura ao prato.
O que dizem os chefs e nutricionistas?
Na cozinha profissional, o uso do arroz sem lavar é comum. Isso porque eles prezam pela textura controlada e têm segurança na procedência do ingrediente. Mas quando o arroz é comprado em feiras, mercados pequenos ou vem de marcas menos conhecidas, o ideal é enxaguar sim, mas com consciência.
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A nutricionista Karina Bravo, da USP, explicou certa vez que “lavar o arroz não é o problema, desde que não seja excessivo a ponto de comprometer os nutrientes que restaram no grão”.
Já o chef Lucas Corazza, conhecido por sua abordagem técnica, vai além: “Lavar arroz não deve ser regra — deve ser uma decisão baseada no tipo de preparo.”
Ou seja: não existe uma única resposta certa, mas sim boas práticas para cada tipo de arroz e objetivo culinário.
E o arroz parboilizado?
Muita gente não sabe, mas o arroz parboilizado é pré-cozido ainda com a casca, o que ajuda a “empurrar” os nutrientes da casca para dentro do grão. Isso faz com que ele retenha mais vitaminas mesmo depois do processo de descasque.
Nesse tipo, lavar é totalmente dispensável — até porque ele já ou por um processo térmico e vem mais limpo. Lavar pode afetar ainda mais a textura. Se você quer praticidade e não abrir mão dos nutrientes, talvez o parboilizado seja uma boa escolha.
Como lavar do jeito certo?
Se você ainda prefere lavar o arroz antes de cozinhar, aqui vai um o a o para não errar:
- Use uma peneira ou bowl largo;
- Coloque o arroz e adicione água filtrada;
- Misture suavemente com as mãos — sem esfregar com força;
- Descarte a água uma ou duas vezes, no máximo;
- Escorra bem antes de levar à a.
Evite deixar o arroz de molho por muito tempo, a menos que a receita exija. Isso também pode causar perda de nutrientes e interferir no cozimento.
Uma história que me fez mudar o jeito de lavar arroz
Lembro de uma vez em que fiz arroz para um jantar em casa e ele ficou absolutamente sem gosto, mesmo com alho e azeite. Contei isso para minha tia, cozinheira experiente, e ela cravou: “Você lavou tanto que deixou só o esqueleto do arroz, menino.” Nunca mais esqueci.
ei a lavar de forma mais leve e a perceber o resultado. O arroz começou a ter mais textura, sabor e até rendimento. E o melhor: fiquei com a sensação de que estava aproveitando melhor o que estava pagando.
Lave com consciência, não por hábito
Lavar o arroz é um costume enraizado, mas precisa ser feito com critério. Quando se entende o porquê do gesto, você ganha controle sobre o sabor, a nutrição e o resultado final da sua comida.
Da próxima vez que for preparar aquele arroz fresquinho, pense duas vezes antes de lavar sem parar. Pode ser que o melhor esteja justamente naquilo que você está deixando escorrer pela pia.
